sexta-feira, março 1

Três pensamentos influenciados por um vinho barato

I

O mormaço
Do meio
De fevereiro,
E eu, improdutivo,
Rendo meu ser
E minha consciência
A um vinho seco
Que me aquece
Mais do que preciso
E destoa este verão:

O que pensar
Diante de um tédio
Tão enorme? Observo
Com olhos prontos a tormenta
Que se arma na noite quente,
O vento que varre a dor do mundo:
O que, além da beleza,
Justifica a minha existência?


II

Tudo o que se passa,
Inumerável, é informação
Processada no grande cérebro
Da realidade - ai! qualquer
Fração disso tudo é demais
Para minha consciência,
Qualquer vírgula divina
É um ponto aos meus olhos
Leigos de mortal.

Quem me dera, ai, quem
Me dera saber tudo por
Decreto, meu unir novamente
Ao uno primordial; ai, eu quero
Retornar a deus, mas sem morrer!

Ai, estar vivo me amargura; ai,
Ser e estar é um desgosto
Sôfrego... ai... já agonizo agora
A agonia de amanhã, pois que viver
Me aborrece, mas a morte me assusta:

Me exilem
Bem longe
De tudo isso...


III

Se faz jus ao nome
O vinho que bebo,
Se presta honras
Ao Dionísio enorme
Que me habita e me
Consola, se me mata
A sede e me deixa com sono,
Se me lembra da melancolia
E da tragédia, se me lembra
Em cada gole largo um beijo
Voluptuoso de quem eu mais
Amei: qual motivo para não
Beber haveria?

Aceno ao todo que me cerca
Com meus olhos que cruzaram
A bruma - e foi o vinho
Quem guiou a barca rota
Pelo lago solitário e sem
Sinalização amiga:

Nas veias do meu instinto
Circula a embriaguez.

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