sábado, junho 16


Não gosto do barulho
Do dia.
Não gosto do dia
E seus inúmeros
Carros
E aviões
E pessoas
E cartazes.
O dia me agride...

É quando cai
A noite
Que tudo se revela
E a beleza nasce,
Enfim,
Do silêncio
(Madura
Como um fruto
Suicida).

quarta-feira, maio 4

13.485

Como te desejei
Quando te vi,
Quando me deste
A linda paz
(A serenidade
Do monge
Da montanha)
Que só poderia
Encontrar
No teu vale
Profundo,
Na tua campina
Esguia.

Sou um eremita
Feliz
Na tua geografia
Rara.

quinta-feira, abril 7

*

Há algo de mim perdido e um pouco vago, como estas ondas
De cores mortas que a praia apresenta, ou solitário como estas
Aves tristes que voam em bandos. O que resta, final das contas,
É sensibilidade atravessada na garganta, fardo pesado nas costas...

Olha o oceano da vida. Como é cinza o céu acima deste céu. Anda,
A chuva não tarda. Não nos cabe nada senão a resignação dura e fria;
Furtaremos, pois, o sol que nos for permitido furtar durante o parco dia
– Quando este brilhar – e, de resto, nós não exigiremos, pois tudo é nada.

Este raio ameno de vida que sou seguirá, inda perdido, mas purificado,
Talvez parte do corpo próprio do cenário que compõe a tal consciência,
Talvez parte da própria areia da praia (e a areia da praia, a quem pertencia?).

Que nós não devemos, então, atestar aos decoros da ansiedade e do pecado
– Porque pecado verdadeiro é ter medo, raciocinar é coisa decadente e séria...
E da tal ganância eu nem falo, pois é a ganância a verdadeira e única miséria.

quinta-feira, novembro 25

781.844.494

O gosto ríspido das tuas palavras me agride. Corro
Assustado na direção (ambígua) de mim mesmo
E me escondo nos escombros do (sombrio) morro
Do meu Ego dilacerado - Orfeu no mar a esmo.

Quem sou eu para tentar te buscar de tão longa distância
- Caminho enegrecido pelas amarguras horrendas do destino -
Ainda mais sem olhar para trás (e bem, ainda muito me alucino
Com a falta tremenda dos teus olhos cravejados de infância).

Com que notas eu comporia uma canção que fosse triste o suficiente
Para explicar ao mundo o quão implacável e dilacerante foi tua ausência?
Que voz (eterna) não desafinaria (nó-na-garganta) por cantar tua carne sacra?

Como - sem te ver sorrir - ser suavemente bom ou grotescamente sorridente?
Hoje ajo como um devasso que (dentre outros pecados puros) até aprecia
O sofrido (chumbo pesado, venenoso) cofre cinza e vermelho onde (ele mesmo) se lacra.

quinta-feira, novembro 11

12.131

Atuação
Inata
Destes
(Símios)
Me arrebenta. Quero uma
Liberdade
Campesina,
Quero décimo-terceiro salário,
Quero o saleiro
Cheio.
Quero tragédia
E dor (alheia),
Quero pouco
Mais
Do
Que
A rima.

(Quero extrair mel
Do sol que brilha
Amarelo sobre o mar
Do mundo azul e verde
De teus olhos perdidos)

26.587

Traço lento. A manhã transcorre
Reta,
Lúcida,
Perdida entre o vão das casas
E entre
O friso
Da Vida.

Escorro,
Desejoso
E suave
Por entre luzes brandas e frios metálicos
(Com gosto de navalha).
Tento extrair todo o calor
(Que há)
Do chão,
Cerco a vida por todos os lados na emboscada
Da poesia - da melancolia - da existência...

E o que sobra? O resto são pássaros
Incestuosos
E ervas (ralas)
A enfeitar
O meu não-jardim.

É a lama dos buracos
Que me lembra que estou (vivo).

terça-feira, novembro 2

324

Que poder sinto fluir
Em meu olho
- Olho que tudo vê,
Olho que vê no escuro -
Tão de repente e tão
(Retumbante)
(E) vivo(!)?

Em que pulso
Eu pulso?
Eu quero
O poder
(Impenterável)
Do cosmo.